Para mim, está mais do que provado: Carlos Carvalhal merece assinar contrato com o Sporting até ao final de 2010-2011. Assim como assim, não vale a pena esperar por aquilo que o seu Sporting possa fazer até ao final da temporada (os Olegários desta vida parece já terem mais ou menos definido quem vai fazer o quê até Maio). E o facto é: quase pela calada, dizendo apenas o que é essencial dizer, Carvalhal fez quase tudo bem até agora. Mexeu na equipa um bocadinho depressa de mais, é certo – e a equipa, afundada no marasmo em que a haviam deixado afundar-se durante quatro longos anos, demorou a responder. Mas pôs a administração da SAD à procura de recursos para fazer o que há tanto tempo era fundamental fazer: contratar jogadores. E, sobretudo, proferiu e institucionalizou a frase mais importante da história recente do clube: aquela em que explicou, num tom tão seguro que quase parecia estranhar o simples facto de ninguém o ter percebido ainda, que o Sporting não pode assentar numa estrutura de “meninos” formados na academia de Alcochete.
Não é preciso dizer o quanto isto significa de corte com o passado recente. Nem, aliás, o quanto isso me enche de esperança, a mim e a outros como eu (e que são muitos mais do que se pensa, apesar de os adoradores de Soares Franco, Paulo Bento e demais miserabilistas tristonhos continuarem a encher os fóruns radiofónicos e os comentários dos jornais online de frases como: “Isto ainda vai correr muito mal…”). Pois é fundamental reconhecê-lo: este discurso, bem como a atitude que o tem coisificado, começou com a chegada de Sá Pinto e Carvalhal a Alvalade. Ora, Sá Pinto não tem, tanto quanto se saiba, um deadline: independentemente dos resultados próximos, há-de ser director desportivo (sim, eu sei que não é “director desportivo” mesmo, mas também nunca ninguém explicou como se diz ao certo) ainda durante algum tempo, podendo mesmo trocar de treinador uma ou outra vez. Já Carvalhal não: tem contrato até Junho apenas – e pode muito bem estar a lançar as bases para outro brilhar.
Não merece. Pelo contrário: merece assinar contrato por pelo menos mais um ano, dispondo da oportunidade de montar uma equipa à sua imagem – e de geri-la depois durante tempo suficiente para que possamos formar uma opinião sobre o seu trabalho e as perspectivas que ele nos abriu. E então, sim, devemos ser implacáveis (implacáveis como nunca fomos com Paulo Bento): se for bom e proporcionar expectativas quanto a um futuro de sucesso, deixá-lo ficar; se for apenas mais ou menos e perder a capacidade de encher-nos de esperança, deixá-lo sair. O Sporting é e tem de continuar a ser um clube grande. Na pior das hipóteses, pode ficar três anos sem ganhar o campeonato (incluindo duas vitórias para o FC Porto e uma para o Benfica), não mais do que isso. E aquilo para que até hoje estávamos a preparar-nos, com Paulo Bento, com o discurso vigente e com a atitude conformista que se institucionalizara, era para passar outros 17 ou 18 anos no deserto, a ganhar uma Taça de Portugal de vez em quando – e, de resto, todos contentinhos porque íamos à Liga dos Campeões fazer figuras tristes.
CRÓNICA DE FUTEBOL ("Futebol: Mesmo"). Jornal de Notícias, 8 de Janeiro de 2010