1. A esmagadora (o adjectivo não é inocente) vitória do Sporting sobre o FC Porto pode trazer apensa a maior das desvantagens, mas veio mesmo a calhar. Num ano em que tudo correu absolutamente mal, um jogo em que tudo corre absolutamente bem não chega para resgatar-nos da nossa miséria, mas sempre nos fez sentir um bocadinho menos mal na nossa própria pele. Não vale a pena mistificá-lo: em condições normais, aquele era jogo para 1-0, tão poucas foram as verdadeiras oportunidades de marcar. Mas houve três golos – e, sobretudo, o Sporting jogou com uma personalidade que há muito tempo não revelava.
Vai ser duro assistir à vitória do Benfica no campeonato. Ao contrário de nós, que festejamos de longe e com ironia, os benfiquistas conseguem ficar verdadeiramente felizes – e não tarda andam para aí aos abraços, às palmadinhas nas costas e mesmo aos calduços aos rivais. Há pessoas a quem não se pode dar confiança, já sabe. Mas ainda restam jogos importantes por disputar. E, se os nossos amigos do Sp. Braga forem capazes de aguentar-se em posição até 11 de Abril, talvez ainda pudéssemos ser nós a decidir este campeonato, no derby da Luz. Que me diz, Domingos: sois homens para isso?
2. A convocação de uma equipa de juniores e emprestados para um treino de conjunto com elementos do plantel oficial, realizado na quarta-feira, pôs os jornais da especialidade em alerta: o Sporting volta a testar os talentos da sua academia, de onde têm surgido tantos e tantos talentos, em mais uma acção destinada à preparação da próxima época. De resto, o facto de a CNN, pela mão do português Pedro Pinto, ter entretanto emitido uma reportagem sobre Alcochete, já reconhecido como um dos melhores centros de formação do mundo, não contribuiu para conter a excitação.
Muito claramente: o Sporting pode incluir um ou dois elementos da formação no plantel da próxima temporada, mas não mais do que isso. Na verdade, já lá os temos a mais. Quando se olha para os grandes clubes da Europa, incluindo aqueles que melhor formação têm, a constatação é óbvia: ninguém vive à base da sua própria escola (a não ser talvez o Ajax, que como sabemos não vence um campeonato há seis anos, nem o vai vencer esta época). Investimento: eis o que precisamos. Repito: investimento. Investimento. Investimento. Investimento.
3. Quem assiste aos jogos de preparação da selecção para o Mundial não pode, de forma nenhuma, sentir-se entusiasmado. Mas também é verdade que várias das melhores selecções que anteontem disputaram jogos amigáveis empataram ou perderam, em alguns casos até frente a equipas de dimensão bem menor. Talvez seja verdade, pois, quando Carlos Queiroz diz que Portugal “resolveu muitos problemas” no jogo com a China. De qualquer maneira, e se de facto ainda há problemas (que os há, que os há…), esta é a altura de resolvê-los.
De resto, não vale a pena começar a fazer contas de cabeça e entregar o coração nas mãos de outra equipa. Mesmo os mais cínicos – inclusive os mais revoltados com esta nova moda das selecções nacionais cheias de estrangeiros, entre os quais gosto de incluir-me – vêem aquela camisola encarnada entrar em campo e de imediato são tomados pela ternura e pela paixão. E, se não o são, não podemos sentir por eles outra coisa senão pena. Portanto, venha o que vier: agora já não há regresso. Força, Portugal.
CRÓNICA DE FUTEBOL ("Futebol: Mesmo"). Jornal de Notícias, 5 de Março de 2010